CRISE CONSTITUCIONAL NA GUINÉ-BISSAU: PAIGC Denuncia "Situação de Não-Estado" e Violação Sistemática da Democracia

 O líder do Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), Domingos Simões Pereira, lançou uma crítica devastadora ao estado atual das instituições guineenses, denunciando uma "situação de não-Estado" no país e classificando como "inconcebível" a exclusão do maior partido político da Guiné-Bissau das próximas eleições legislativas, marcadas para 23 de novembro. As declarações do dirigente político revelam a profundidade da crise institucional que atravessa o país e levantam sérias questões sobre a legitimidade do processo democrático em curso.





O PAIGC e sua Exclusão Eleitoral: Uma Anomalia Democrática

A exclusão do PAIGC das eleições legislativas de 23 de novembro representa uma anomalia sem precedentes na história democrática da Guiné-Bissau. Como o "maior partido político da Guiné-Bissau", conforme sublinhou Domingos Simões Pereira, o PAIGC tem desempenhado um papel central na vida política do país desde a independência.

O partido, fundado por Amílcar Cabral e que liderou a luta pela independência da Guiné-Bissau e Cabo Verde, possui uma base social significativa e uma história de participação eleitoral que remonta ao início do processo de democratização no país. A sua exclusão do processo eleitoral levanta questões fundamentais sobre:

Legitimidade Democrática

  • Como podem eleições ser consideradas livres e justas sem a participação do maior partido do país?
  • Que impacto terá esta exclusão na representatividade do futuro parlamento?
  • Qual a validade de um processo eleitoral que exclui uma parte significativa do espectro político?

Precedente Perigoso

  • A exclusão arbitrária de partidos políticos estabelece um precedente autoritário
  • Pode encorajar futuras manipulações do processo eleitoral
  • Representa uma violação dos princípios democráticos fundamentais

Processo Eleitoral Tardio: Violação Constitucional Sistemática

Domingos Simões Pereira foi categórico ao afirmar que o escrutínio de novembro "já chega fora de prazo", sublinhando que "todos os prazos constitucionais foram violados". Esta denúncia aponta para um padrão sistemático de desrespeito pela Constituição da República, documento que deveria ser a base de toda a atividade política e institucional.

Análise dos Prazos Constitucionais

A Constituição da Guiné-Bissau estabelece prazos específicos para a realização de eleições, visando garantir a continuidade democrática e a estabilidade institucional. A violação destes prazos não é meramente técnica, mas representa:

Quebra da Ordem Constitucional

  • Desrespeito pelos princípios fundamentais do Estado de Direito
  • Erosão da previsibilidade jurídica necessária ao funcionamento democrático
  • Criação de precedentes perigosos para futuras administrações

Impacto na Legitimidade

  • Questiona a validade legal dos atos praticados fora dos prazos constitucionais
  • Pode gerar contestação judicial dos resultados eleitorais
  • Reduz a confiança pública nas instituições

O Estado das Instituições Eleitorais

O líder do PAIGC apontou que as instituições com responsabilidade na organização das eleições não estão a funcionar em pleno. Esta situação é particularmente grave quando se consideram as funções essenciais destas instituições:

Recenseamento Eleitoral

  • Processo fundamental para garantir o direito de voto a todos os cidadãos
  • Base para a legitimidade dos resultados eleitorais
  • Instrumento de transparência democrática

Garantia de Transparência

  • Supervisão independente do processo eleitoral
  • Fiscalização das campanhas eleitorais
  • Resolução de disputas eleitorais

A Assembleia Nacional Popular: Funcionamento Condicionado

A afirmação de que "o próprio funcionamento da Assembleia Nacional Popular está condicionado" revela a extensão da crise institucional. O parlamento, enquanto órgão de soberania que representa o povo, deveria funcionar de forma independente e autónoma.

Consequências do Funcionamento Condicionado

Para a Separação de Poderes

  • Desequilíbrio entre os órgãos de soberania
  • Concentração excessiva de poder no executivo
  • Erosão dos mecanismos de controlo democrático

Para a Representação Popular

  • Limitação da capacidade de os deputados representarem os seus eleitores
  • Redução da eficácia legislativa
  • Comprometimento do debate democrático

Ambiente de Impedimento Democrático

Domingos Simões Pereira acusou as autoridades de terem criado "de forma deliberada um ambiente que impede uma verdadeira expressão democrática por parte do povo guineense". Esta acusação sugere uma estratégia coordenada para limitar o exercício dos direitos democráticos, incluindo:

Restrições Sistemáticas

  • Limitação da liberdade de expressão política
  • Obstáculos à participação cívica
  • Manipulação dos processos eleitorais

Impacto na Sociedade Civil

  • Redução do espaço para a atividade das organizações não-governamentais
  • Intimidação de ativistas e líderes da oposição
  • Clima de medo e autocensura

"Situação de Não-Estado": Colapso Institucional

A expressão "situação de não-Estado", utilizada por Domingos Simões Pereira, representa uma das acusações mais graves que um líder político pode fazer contra um governo. Esta caracterização implica que as estruturas fundamentais do Estado deixaram de funcionar adequadamente.

Critérios para um "Não-Estado"

Segundo o líder do PAIGC, esta situação caracteriza-se por:

Desrespeito Constitucional

  • "Quando a Constituição não é respeitada"
  • Violação sistemática das normas fundamentais
  • Ausência de Estado de Direito

Ignorância dos Prazos Legais

  • "Quando os prazos são ignorados"
  • Desorganização administrativa
  • Falta de previsibilidade jurídica

Falta de Independência dos Órgãos Eleitorais

  • "Quando os órgãos eleitorais não são independentes nem credíveis"
  • Manipulação do processo democrático
  • Perda de confiança nas instituições

Contexto Histórico do Alerta

Domingos Simões Pereira recordou que há mais de dois anos tem vindo a alertar para o risco de colapso institucional. Este facto demonstra que a atual crise não surgiu repentinamente, mas foi o resultado de um processo gradual de erosão institucional que o líder da oposição vem documentando.

Evolução da Crise

  • Alertas iniciais ignorados pelas autoridades
  • Deterioração progressiva das instituições
  • Culminação numa crise de legitimidade

Responsabilidade de Alerta

  • Papel da oposição como "cão de guarda" da democracia
  • Importância do debate político plural
  • Necessidade de vigilância democrática constante

Escalada da Violência: "Outro Patamar" de Repressão

Uma das acusações mais graves feitas por Domingos Simões Pereira relaciona-se com a escalada da violência política. O líder do PAIGC afirmou que "quando se chega ao ponto de se sequestrar e assassinar cidadãos – não apenas violentar, como no passado –, atinge-se outro patamar".

Análise da Violência Política

Evolução Temporal

  • Passado: Violência física, mas sem consequências fatais
  • Presente: Sequestros e assassinatos
  • Escalada: "Outro patamar" de repressão

Caracterização do Regime

  • "Carácter violento e criminoso deste regime"
  • Uso sistemático da violência para fins políticos
  • Instrumentalização do medo como ferramenta de controlo

Contexto Regional e Internacional

A violência política na Guiné-Bissau não ocorre num vácuo, mas insere-se num contexto regional mais amplo de instabilidade na África Ocidental:

Tendências Regionais

  • Aumento dos golpes de Estado na região
  • Erosão democrática em vários países
  • Influência de atores externos desestabilizadores

Impacto Internacional

  • Preocupação das organizações internacionais
  • Possíveis sanções e isolamento diplomático
  • Efeitos nos programas de cooperação

Esperança e Realismo: "O Pior Já Passou"?

Apesar da gravidade da situação, Domingos Simões Pereira expressou esperança de que "tenhamos atingido o ponto mais alto de violência, e que não haja mais mortes". Esta declaração revela uma perspetiva que combina realismo político com esperança humanitária.

O Valor da Vida Humana

A afirmação de que "cada vida humana é insubstituível" coloca a dimensão humana no centro do debate político, lembrando que por trás das disputas políticas estão pessoas reais com famílias e aspirações.

Princípios Humanitários

  • Inviolabilidade da vida humana
  • Rejeição da violência como meio político
  • Apelo à reconciliação nacional

Responsabilidade Política

  • Dever dos líderes de proteger os cidadãos
  • Necessidade de diálogo em vez de confronto
  • Construção de consensos nacionais

A Dissolução Parlamentar: Precedente Constitucional Grave

A dissolução da Assembleia Nacional Popular em dezembro de 2023 pelo Presidente Umaro Sissoco Embaló representa um dos momentos mais controversos da crise atual. Esta decisão ocorreu "antes do prazo mínimo de 12 meses previsto pela Constituição", estabelecendo um precedente constitucional extremamente grave.

Contexto da Dissolução

Resultado Eleitoral

  • A assembleia dissolvida tinha sido eleita através de eleições ganhas pela coligação PAI-Terra Ranka
  • Esta coligação era liderada pelo PAIGC
  • Representava a vontade expressa do povo guineense

Violação Constitucional

  • A Constituição estabelece um prazo mínimo de 12 meses antes da possibilidade de dissolução
  • Esta salvaguarda visa proteger a estabilidade democrática
  • A violação deste prazo é uma usurpação dos direitos do parlamento

Consequências da Dissolução

Para Domingos Simões Pereira

  • Afastamento da presidência da Assembleia Nacional
  • Perda da liderança da comissão permanente
  • Erosão da sua posição política institucional

Para o Sistema Político

  • Intensificação do clima de tensão política
  • Questionamento da legitimidade presidencial
  • Precedente perigoso para futuras dissoluções

O PAIGC na História da Guiné-Bissau

Para compreender a gravidade da exclusão do PAIGC das eleições, é essencial contextualizar o papel histórico deste partido na construção da nação guineense.

Fundação e Luta de Libertação

Amílcar Cabral e a Independência

  • Fundado por Amílcar Cabral, um dos grandes pensadores africanos
  • Liderou a luta armada contra o colonialismo português
  • Proclamou a independência em 1973, reconhecida internacionalmente em 1974

Ideologia e Valores

  • Panafricanismo e solidariedade africana
  • Justiça social e desenvolvimento nacional
  • Democracia participativa e soberania popular

Papel no Período Democrático

Transição Democrática

  • Participação ativa na transição do partido único para o multipartidarismo
  • Aceitação dos princípios democráticos
  • Alternância no poder de forma pacífica

Governação e Oposição

  • Experiência tanto na governação como na oposição
  • Contribuição para a estabilidade democrática
  • Papel construtivo no desenvolvimento nacional

Análise Institucional: Órgãos de Soberania em Crise

A crise atual afeta todos os órgãos de soberania da República da Guiné-Bissau, criando um vácuo institucional perigoso.

Presidência da República

Concentração de Poder

  • Dissolução parlamentar fora dos prazos constitucionais
  • Gestão autoritária das crises políticas
  • Instrumentalização das instituições

Legitimidade Questionada

  • Ações fora do quadro constitucional
  • Falta de consenso nacional
  • Isolamento internacional crescente

Assembleia Nacional Popular

Funcionamento Comprometido

  • Dissolução inconstitucional
  • Limitação das funções parlamentares
  • Redução da representatividade democrática

Impacto na Legislação

  • Paralisia legislativa
  • Impossibilidade de controlo do executivo
  • Ausência de debate democrático

Sistema Judicial

Independência Ameaçada

  • Pressões políticas sobre os tribunais
  • Instrumentalização da justiça
  • Erosão do Estado de Direito

Consequências

  • Impunidade crescente
  • Falta de confiança nas instituições judiciais
  • Recurso à violência extrajudicial

Impacto Económico da Crise Política

A instabilidade política tem consequências diretas no desenvolvimento económico do país, afetando a vida quotidiana dos cidadãos guineenses.

Investimento e Desenvolvimento

Desconfiança Internacional

  • Redução do investimento estrangeiro
  • Suspensão de programas de cooperação
  • Isolamento económico crescente

Impacto Interno

  • Fuga de capitais
  • Redução da atividade económica
  • Aumento do desemprego

Setor Público

Funcionamento Administrativo

  • Paralisia da administração pública
  • Redução da qualidade dos serviços públicos
  • Corrupção e má gestão

Recursos Públicos

  • Má aplicação dos recursos do Estado
  • Prioridades políticas em detrimento do desenvolvimento
  • Endividamento crescente

Sociedade Civil e Organizações Internacionais

O papel da sociedade civil e das organizações internacionais torna-se crucial em momentos de crise democrática como o atual.

Liga Guineense dos Direitos Humanos

Papel de Monitorização

  • Documentação das violações dos direitos humanos
  • Alerta para a degradação do Estado de Direito
  • Pressão por reformas democráticas

Legitimidade Civil

  • Representação da sociedade civil organizada
  • Voz independente na análise política
  • Ponte entre o povo e as instituições

Organizações Internacionais

CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental)

  • Mediação nas crises políticas regionais
  • Aplicação de sanções quando necessário
  • Promoção da estabilidade democrática

União Africana

  • Princípios de governação democrática
  • Rejeição de mudanças inconstitucionais de governo
  • Apoio aos processos de reconciliação

Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP)

  • Laços históricos e culturais
  • Apoio técnico e político
  • Mediação com base na proximidade linguística

Cenários Futuros: Possíveis Desenvolvimentos

A situação atual na Guiné-Bissau pode evoluir em várias direções, dependendo das ações dos diferentes atores políticos e da resposta da comunidade internacional.

Cenário de Reconciliação

Diálogo Nacional

  • Negociações entre todas as forças políticas
  • Inclusão do PAIGC no processo eleitoral
  • Reforma das instituições democráticas

Reformas Constitucionais

  • Clarificação dos poderes dos órgãos de soberania
  • Fortalecimento dos mecanismos de controlo
  • Garantias para a alternância democrática

Cenário de Agravamento

Escalada da Violência

  • Aumento da repressão política
  • Possível conflito civil
  • Intervenção militar regional

Colapso Institucional

  • Paralisia completa das instituições
  • Estado falhado
  • Consequências humanitárias graves

Cenário de Intervenção Internacional

Mediação Regional

  • Papel ativo da CEDEAO
  • Pressão diplomática coordenada
  • Sanções económicas específicas

Apoio Técnico

  • Assistência na reforma institucional
  • Apoio ao processo eleitoral
  • Fortalecimento da sociedade civil

Lições da História: Outros Casos Africanos

A experiência de outros países africanos pode oferecer insights valiosos sobre como lidar com crises democráticas similares.

Casos de Sucesso

Gana

  • Transição democrática bem-sucedida
  • Alternância pacífica no poder
  • Instituições democráticas estáveis

Botswana

  • Estabilidade política duradoura
  • Crescimento económico sustentado
  • Respeito pelo Estado de Direito

Casos de Advertência

Mali

  • Sucessivos golpes de Estado
  • Instabilidade crónica
  • Consequências regionais graves

Burkina Faso

  • Erosão democrática
  • Violência política crescente
  • Intervenção militar

O Papel da Diáspora Guineense

A comunidade guineense no exterior tem um papel importante na resolução da crise atual através da pressão diplomática e do apoio político.

Mobilização Internacional

Sensibilização

  • Divulgação da situação junto das autoridades dos países de acolhimento
  • Mobilização da opinião pública internacional
  • Pressão sobre organizações internacionais

Apoio Económico

  • Remessas para as famílias
  • Investimento no desenvolvimento nacional
  • Apoio a organizações da sociedade civil

Media e Liberdade de Imprensa

O papel dos órgãos de comunicação social é fundamental para informar o público sobre a evolução da crise e manter a pressão por transparência.

Desafios para os Jornalistas

Segurança

  • Ameaças e intimidação
  • Restrições à liberdade de movimento
  • Censura e autocensura

Acesso à Informação

  • Limitação do acesso a fontes oficiais
  • Controlo da informação pelo poder
  • Desinformação e propaganda

Papel dos Media Internacionais

Cobertura Independente

  • Reportagem objetiva dos eventos
  • Análise imparcial da situação
  • Pressão por transparência

Recomendações para a Resolução da Crise

Com base na análise da situação atual, várias medidas podem contribuir para a resolução da crise democrática na Guiné-Bissau.

Medidas Imediatas

Inclusão Eleitoral

  • Garantir a participação do PAIGC nas eleições
  • Respeitar os direitos de todos os partidos políticos
  • Assegurar condições equitativas de campanha

Cessar a Violência

  • Fim imediato da violência política
  • Investigação dos crimes cometidos
  • Responsabilização dos culpados

Reformas Estruturais

Reforma Constitucional

  • Clarificação dos poderes presidenciais
  • Fortalecimento do parlamento
  • Independência do sistema judicial

Reforma Eleitoral

  • Comissão eleitoral independente
  • Transparência no processo eleitoral
  • Fiscalização internacional

Apoio Internacional

Mediação Política

  • Facilitação do diálogo entre os atores políticos
  • Apoio técnico às reformas
  • Monitorização internacional

Apoio Económico

  • Programas de desenvolvimento condicionados à democracia
  • Apoio ao fortalecimento institucional
  • Combate à corrupção

Conclusão: Um Momento Decisivo para a Democracia Guineense

As declarações de Domingos Simões Pereira revelam a profundidade da crise democrática que atravessa a Guiné-Bissau. A descrição de uma "situação de não-Estado" não é apenas retórica política, mas reflete uma realidade preocupante de erosão institucional e violação sistemática dos princípios democráticos.

A exclusão do maior partido político do país das eleições legislativas representa uma anomalia democrática que questiona a legitimidade de todo o processo eleitoral. Quando somada à dissolução inconstitucional do parlamento, à violação dos prazos constitucionais e à escalada da violência política, esta exclusão compõe um quadro de grave retrocesso democrático.

O Imperativo da Ação

A situação atual exige uma resposta coordenada de todos os atores comprometidos com a democracia:

Atores Nacionais

  • Partidos políticos devem privilegiar o diálogo sobre o confronto
  • Sociedade civil deve manter a pressão por transparência
  • Cidadãos devem exercer os seus direitos democráticos

Comunidade Internacional

  • Organizações regionais devem mediar ativamente
  • Países parceiros devem aplicar pressão diplomática
  • Organizações internacionais devem monitorizar a situação

Perspetivas de Futuro

O futuro da democracia na Guiné-Bissau depende da capacidade dos diversos atores de encontrarem um caminho de reconciliação que permita:

  • Restauração da legalidade constitucional
  • Inclusão de todos os atores políticos legítimos
  • Fim da violência e da intimidação
  • Reformas institucionais duradouras

A esperança expressa por Domingos Simões Pereira de que "tenhamos atingido o ponto mais alto de violência" deve ser transformada em ação concreta para construir um futuro democrático sustentável. O reconhecimento de que "cada vida humana é insubstituível" deve orientar todas as ações políticas futuras.

A Guiné-Bissau encontra-se numa encruzilhada histórica. O caminho escolhido nas próximas semanas e meses determinará se o país conseguirá superar esta crise e fortalecer as suas instituições democráticas, ou se continuará na espiral de instabilidade que tem caracterizado grande parte da sua história pós-independência.

O eco das palavras do líder do PAIGC serve como um alerta final: a democracia não é um dado adquirido, mas um bem precioso que exige vigilância constante e defesa ativa. A responsabilidade pela preservação deste bem não recai apenas sobre os políticos, mas sobre toda a sociedade guineense e a comunidade internacional que valoriza os princípios democráticos e os direitos humanos.

Caso Tano Bari: A Sombra da Violência Institucional Paira sobre a Guiné-Bissau


Presidente Embaló Confirma Desaparecimento mas Nega Ligação com Corpo Encontrado em João Landim


O caso do desaparecimento de Mamado Tano Bari, agente de segurança presidencial na Guiné-Bissau, transformou-se num dos episódios mais controversos e potencialmente explosivos da atual administração do Presidente Umaro Sissoco Embaló. Com implicações que se estendem muito além de um simples caso de pessoa desaparecida, este incidente expõe fissuras profundas no aparelho de segurança do Estado e levanta questões fundamentais sobre o estado de direito no país.

A confirmação oficial do desaparecimento pelo próprio Presidente, conjugada com a sua negação da ligação ao corpo encontrado no rio Mansoa, em João Landim, no contexto de um áudio vazado que revela tensões internas nos serviços de segurança, coloca a Guiné-Bissau perante mais um momento de crise institucional que ameaça a já frágil estabilidade política do país.




Contexto Imediato: As Declarações Presidenciais

A Confirmação Oficial

Na tarde desta quinta-feira, 31 de julho, numa declaração que muitos analistas políticos consideram tanto esclarecedora quanto preocupante, o Presidente Umaro Sissoco Embaló confirmou publicamente o desaparecimento do seu agente de segurança, Mamado Tano Bari. As declarações foram prestadas aos jornalistas na saída de mais uma reunião ordinária do Conselho de Ministros, no Palácio do Governo, num momento em que a pressão mediática e da sociedade civil sobre o caso atingia níveis sem precedentes.

"Quero estar com a prudência em relação a este assunto, o meu segurança desapareceu, não morto por enquanto, mas há inquérito que está a ser feita pela Polícia Judiciária e a Inteligência Militar", declarou o Presidente, numa formulação cuidadosa que, simultaneamente, reconhece a gravidade da situação e procura manter alguma distância institucional relativamente às especulações que têm circulado.

A Negação da Ligação

Particularmente significativa foi a negação presidencial de qualquer ligação entre o desaparecimento de Tano Bari e o corpo descoberto no rio Mansoa, em João Landim, no passado fim de semana. Esta negação surge numa altura em que os familiares do agente desaparecido têm insistido publicamente que o corpo encontrado pertence ao seu ente querido, criando uma situação de tensão entre as versões oficial e familiar dos acontecimentos.

"O corpo encontrado no João Landim foi assegurado pelo serviço competente de que, em nenhum momento foi desamarrado tendo em conta o estado avançado da decomposição, por tanto tenho a reserva a estas especulações", explicou Embaló, numa declaração que, embora procure ser técnica e objetiva, levanta mais questões do que fornece respostas.


O Contexto Familiar: Ligações Perigosas

Conexões com o Aparelho de Segurança

Um dos aspectos mais intrigantes e potencialmente explosivos deste caso reside nas conexões familiares de Mamado Tano Bari. O agente desaparecido é irmão mais novo do antigo chefe de segurança do Presidente Umaro Sissoco Embaló, que se encontra detido há mais de um mês no Estado-Maior General das Forças Armadas, em Amura.

Esta ligação familiar não é meramente circunstancial. Na intrincada rede de lealdades pessoais e profissionais que caracteriza o aparelho de segurança guineense, as relações familiares desempenham frequentemente um papel crucial na definição de alianças e inimizades. O facto de dois irmãos terem ocupado posições sensíveis na estrutura de segurança presidencial, e ambos se encontrarem agora em situações problemáticas, sugere a existência de tensões mais profundas dentro do próprio núcleo do poder.

Implicações para a Segurança Presidencial

A situação dos irmãos Tano Bari levanta questões fundamentais sobre a integridade e coesão do aparelho de segurança presidencial. Se elementos tão próximos do Presidente se encontram em situações de conflito ou desaparecimento, que implicações isto tem para a própria segurança do chefe de Estado e, por extensão, para a estabilidade política do país?


O Áudio Revelador: Janela para as Tensões Internas

Confirmação da Autenticidade

Um dos elementos mais dramáticos e potencialmente incriminatórios neste caso é a existência de um áudio vazado nas redes sociais no qual o Presidente Embaló discute com Mamado Tano Bari questões relacionadas com perseguições internas nos serviços de segurança. Confrontado pelos jornalistas sobre a autenticidade desta gravação, o Presidente confirmou que "o áudio era verídico", uma admissão que adiciona uma dimensão de transparência forçada a um caso já complexo.

Revelações sobre Perseguições Internas

O conteúdo do áudio, segundo os relatos disponíveis, revela a existência de "perseguições" internas nos serviços de segurança, uma situação que sugere divisões profundas e potencialmente perigosas no seio do aparelho estatal responsável pela proteção do próprio Presidente. Estas revelações são particularmente preocupantes num país como a Guiné-Bissau, onde a história recente está repleta de golpes de Estado e instabilidade política frequentemente originada em divisões dentro das forças de segurança.

Implicações para a Governança

A existência documentada de tensões e perseguições internas nos serviços de segurança presidencial levanta questões sérias sobre a capacidade do atual governo de manter controlo sobre o próprio aparelho estatal. Se o Presidente não consegue garantir a coesão e lealdade dos seus próprios serviços de segurança, como pode esperar-se que mantenha a estabilidade política mais ampla?


A Resposta da Sociedade Civil: LGDH na Linha da Frente

Exigência de Investigação Independente

A Liga Guineense dos Direitos Humanos (LGDH) emergiu como a voz mais proeminente e persistente na exigência de esclarecimentos sobre o caso Tano Bari. Na segunda-feira, a organização formalizou um apelo para "a abertura imediata de uma investigação independente, imparcial e transparente, para identificar e responsabilizar os atores morais no assassinato do Mamado Tano Bari", utilizando deliberadamente o termo "assassinato" numa clara indicação de que considera o agente como morto.

Esta posição da LGDH é significativa não apenas pelo seu conteúdo, mas também pelo timing. Ao exigir uma investigação independente antes mesmo da confirmação oficial da morte, a organização está essencialmente a questionar a capacidade ou vontade das autoridades oficiais de conduzir uma investigação credível.

Diagnóstico de Crise Institucional

Mais alarmante ainda é o diagnóstico mais amplo apresentado pela LGDH sobre o estado da governança na Guiné-Bissau. Segundo a organização, "a suposta execução sumária de Mamado Tano Barro e as sistemáticas e ilegais detenções arbitrárias de inúmeros cidadãos, não são meros episódios isolados, são manifestações gritantes de uma escala intolerável de violência institucionalizada".

Este diagnóstico vai muito além do caso específico de Tano Bari, apresentando uma visão sistémica de deterioração institucional que inclui "acelerada desintegração do estado de direito" e "colocação do país numa crise devastadora, dominada por uma impunidade corrosiva, um clima de terror generalizada e a destruição progressiva das liberdades mais básicas na Guiné-Bissau".


Análise do Discurso Presidencial: Entre Prudência e Evasão

A Estratégia da Prudência

A abordagem do Presidente Embaló ao caso Tano Bari caracteriza-se por aquilo que ele próprio descreve como "prudência". Esta prudência manifesta-se numa série de formulações cuidadosas que procuram equilibrar o reconhecimento da gravidade da situação com a manutenção de alguma distância relativamente às especulações mais dramáticas.

Frases como "desapareceu, não morto por enquanto" e "tenho a reserva a estas especulações" revelam uma estratégia comunicacional que procura ganhar tempo e espaço de manobra, evitando compromissos definitivos enquanto as investigações decorrem.

O Recurso ao Segredo de Justiça

Particularmente significativo é o recurso do Presidente ao conceito de "segredo de justiça" como justificação para a limitação das suas declarações públicas. "O que está no segredo da justiça o presidente não pode chegar e criar desordem", declarou, numa formulação que, embora tecnicamente correta, pode ser interpretada como uma tentativa de evitar escrutínio público sobre questões inconvenientes.

Promessas de Justiça

Contudo, o Presidente também fez declarações que podem ser interpretadas como promessas de que a justiça será feita. "O que posso vos garantir é que este, não vai ficar impune, independentemente do seu comportamento, porque não gosta da violência", prometeu, numa formulação ambígua que tanto pode referir-se ao próprio Tano Bari quanto a eventuais responsáveis pelo seu desaparecimento.


Contexto Histórico: Padrões de Instabilidade

A Tradição de Golpes

Para compreender plenamente as implicações do caso Tano Bari, é essencial situá-lo no contexto da longa história de instabilidade política da Guiné-Bissau. Desde a independência em 1974, o país registou múltiplos golpes de Estado, tentativas de golpe, e períodos de grave instabilidade política, muitos dos quais originados em divisões dentro das forças armadas e de segurança.

Esta história cria um contexto em que qualquer sinal de tensão ou divisão nos serviços de segurança é automaticamente interpretado como potencialmente explosivo, tanto pela população quanto pelos observadores internacionais.

O Papel Central dos Serviços de Segurança

Na Guiné-Bissau, como em muitos países da África Ocidental, os serviços de segurança desempenham um papel que vai muito além das suas funções técnicas. São simultaneamente guardiões do poder estabelecido e potenciais ameaças a esse mesmo poder, dependendo das dinâmicas internas de lealdade e interesse.

O caso Tano Bari insere-se nesta tradição de tensões internas nos serviços de segurança, mas com a particularidade adicional de envolver directamente elementos da segurança presidencial, o que eleva significativamente as apostas políticas.

Precedentes Preocupantes

A história recente da Guiné-Bissau inclui vários casos de desaparecimentos ou mortes suspeitas de figuras ligadas ao aparelho de segurança, muitos dos quais nunca foram adequadamente esclarecidos. Este padrão de impunidade contribui para um clima de desconfiança e especulação que torna casos como o de Tano Bari particularmente explosivos.


Implicações para o Estado de Direito

Erosão da Confiança Institucional

O caso Tano Bari surge num momento em que a confiança nas instituições públicas guineenses já se encontra sob pressão considerável. A incapacidade de fornecer respostas claras e convincentes sobre o paradeiro de um agente de segurança presidencial apenas agrava esta erosão da confiança.

Quando os próprios serviços de segurança do Estado se tornam objeto de desconfiança e especulação, o tecido social e político do país fica inevitavelmente fragilizado.

O Desafio da Transparência

Um dos aspectos mais preocupantes deste caso é a tensão evidente entre as exigências de transparência da sociedade civil e a tendência das autoridades para o secretismo. Embora o Presidente tenha confirmado alguns factos básicos, muitas questões fundamentais permanecem sem resposta.

Esta tensão não é meramente técnica ou processual; reflecte conceções diferentes sobre o que constitui governança democrática e responsabilização pública.

Impacto nas Liberdades Fundamentais

As preocupações expressas pela LGDH sobre "destruição progressiva das liberdades mais básicas" sugerem que o caso Tano Bari é sintomático de problemas mais amplos na proteção dos direitos fundamentais dos cidadãos guineenses.

Se elementos dos próprios serviços de segurança não estão seguros, que segurança podem esperar os cidadãos comuns?


Dimensões Regionais e Internacionais

Padrões Regionais

O caso Tano Bari deve ser compreendido no contexto mais amplo dos desafios de governança enfrentados por muitos países da África Ocidental. Questões como tensões internas nos serviços de segurança, desaparecimentos suspeitos, e erosão do estado de direito são infelizmente comuns na região.

Preocupações Internacionais

A comunidade internacional, incluindo parceiros de desenvolvimento da Guiné-Bissau, acompanha estes desenvolvimentos com crescente preocupação. A estabilidade política e institucional do país é vista como crucial não apenas para o bem-estar dos próprios guineenses, mas também para a estabilidade regional mais ampla.

Implicações para o Apoio ao Desenvolvimento

Casos como o de Tano Bari podem ter implicações práticas para o apoio internacional ao desenvolvimento da Guiné-Bissau. Muitos parceiros condicionam o seu apoio ao progresso na governança e respeito pelos direitos humanos.


O Papel dos Média: Responsabilidades e Desafios

Cobertura em Ambiente de Tensão

O caso Tano Bari ilustra os desafios enfrentados pelos meios de comunicação guineenses na cobertura de questões politicamente sensíveis. A necessidade de informar o público deve ser equilibrada com considerações de segurança pessoal e responsabilidade editorial.

A Importância da Investigação Jornalística

Este caso sublinha a importância crucial da investigação jornalística independente na Guiné-Bissau. Na ausência de transparência oficial adequada, os jornalistas desempenham um papel vital na descoberta e divulgação de informações de interesse público.

Riscos e Limitações

Contudo, os jornalistas guineenses operam num ambiente que pode ser hostil à investigação independente, particularmente quando esta envolve questões de segurança ou elementos próximos do poder político.


Análise Legal: Questões de Processo e Substância

O Papel da Polícia Judiciária

A confirmação de que a Polícia Judiciária está a conduzir uma investigação é positiva, mas levanta questões sobre a independência e capacidade desta instituição para lidar com um caso politicamente sensível que envolve elementos próximos do poder presidencial.

Inteligência Militar: Duplo Papel

O envolvimento da Inteligência Militar na investigação é simultaneamente compreensível (dada a natureza do caso) e potencialmente problemático (dada a possibilidade de conflitos de interesse).

Questões de Jurisdição e Competência

A complexidade jurisdicional deste caso - envolvendo elementos civis e militares, questões de segurança nacional e direitos fundamentais - coloca desafios significativos ao sistema judicial guineense.


Cenários Futuros: Possibilidades e Riscos

Cenário de Esclarecimento

No melhor cenário possível, as investigações em curso conseguirão esclarecer definitivamente o paradeiro de Mamado Tano Bari e as circunstâncias do seu desaparecimento, restaurando alguma confiança nas instituições públicas.

Cenário de Impunidade

Contudo, baseando-se em precedentes históricos, existe o risco real de que o caso nunca seja adequadamente esclarecido, contribuindo para o padrão de impunidade que caracteriza muitos casos similares na história recente do país.

Cenário de Escalada

O pior cenário possível seria uma escalada das tensões que pudesse desestabilizar ainda mais o aparelho de segurança e, por extensão, a estabilidade política do país.


Recomendações para Stakeholders

Para as Autoridades

As autoridades guineenses devem priorizar a transparência e a prestação de contas neste caso, reconhecendo que a credibilidade das instituições públicas está em jogo.

Para a Sociedade Civil

As organizações da sociedade civil devem manter a pressão para esclarecimentos, mas de forma construtiva que contribua para o fortalecimento institucional.

Para os Parceiros Internacionais

A comunidade internacional deve acompanhar de perto os desenvolvimentos, oferecendo apoio técnico para o fortalecimento das instituições judiciais e de segurança.

Para os Média

Os meios de comunicação devem continuar a cobrir o caso de forma responsável e equilibrada, contribuindo para a informação pública sem comprometer a segurança ou prejudicar as investigações legítimas.


Conclusão: Um Momento Decisivo

O caso Mamado Tano Bari representa mais do que o desaparecimento de um indivíduo; simboliza os desafios fundamentais que a Guiné-Bissau enfrenta na construção de um Estado de direito funcional e na consolidação da sua democracia.

As próximas semanas e meses serão cruciais para determinar se este caso contribuirá para o fortalecimento ou para a erosão adicional das instituições públicas guineenses. A forma como as autoridades, a sociedade civil, e a comunidade internacional respondem a este desafio terá implicações duradouras para o futuro político do país.

O que está em jogo não é apenas a descoberta da verdade sobre o que aconteceu a Mamado Tano Bari, mas a própria credibilidade do projeto democrático guineense. Numa altura em que muitos países da região enfrentam desafios similares de governança e estabilidade, a Guiné-Bissau tem a oportunidade de demonstrar que é possível enfrentar crises institucionais de forma transparente e responsável.

A esperança é que, independentemente do desfecho específico do caso Tano Bari, ele possa servir como catalisador para reformas mais amplas que fortaleçam o estado de direito e restaurem a confiança dos cidadãos nas suas instituições. Só assim a Guiné-Bissau poderá romper definitivamente com os padrões de instabilidade e impunidade que têm caracterizado a sua história recente.

Organizações Exigem Investigações Independentes e Responsabilização de Umaro Sissoco Embaló


Bissau, 28 de julho de 2025 - O Espaço de Concertação das Organizações da Sociedade Civil da Guiné-Bissau e a Frente Popular emitiram uma condenação conjunta contundente nesta segunda-feira, denunciando o assassinato do ex-agente da segurança presidencial Mamadu Tano Bari e a violenta agressão ao jornalista da RTP-África, Waldir Araújo. As organizações responsabilizam diretamente o ex-Presidente Umaro Sissoco Embaló pelos incidentes e exigem investigações independentes imediatas.



O Contexto da Violência

Em comunicado oficial enviado à CFM (Confederação de Futebol da Guiné-Bissau), as duas organizações da sociedade civil afirmaram que o país "voltou a mergulhar num cenário de horror e indignação" após o que classificaram como "hediondo e cruel" assassinato de Mamadu Tano Bari, ocorrido recentemente na capital guineense.

O caso de Mamadu Tano Bari representa mais um episódio na crescente espiral de violência política que tem caracterizado a Guiné-Bissau nos últimos anos. Como ex-agente da segurança presidencial, Bari ocupava uma posição sensível no aparelho de Estado, tornando sua morte particularmente preocupante para a estabilidade institucional do país.

Dupla Agressão: Segurança e Imprensa sob Ataque

Paralelamente ao assassinato de Bari, o jornalista Waldir Araújo, correspondente da RTP-África, foi brutalmente agredido no domingo (27 de julho) no centro de Bissau. Este ataque representa uma grave violação da liberdade de imprensa e um atentado direto contra o direito fundamental à informação.

A agressão ao jornalista da RTP ocorreu em pleno centro da capital, demonstrando a audácia dos perpetradores e evidenciando o clima de impunidade que parece prevalecer no país. O timing dos dois incidentes - o assassinato de um ex-agente de segurança e a agressão a um jornalista internacional - sugere uma possível coordenação ou, no mínimo, um ambiente propício à violência política.

Responsabilização Direta do Ex-Presidente

De forma inequívoca, o Espaço de Concertação das Organizações da Sociedade Civil e a Frente Popular responsabilizam diretamente Umaro Sissoco Embaló, ex-Presidente da República da Guiné-Bissau, por ambos os incidentes. Esta acusação direta contra uma figura de tal proeminência política demonstra a gravidade da situação e a deterioração das relações entre a sociedade civil e o antigo líder.

Umaro Sissoco Embaló, que governou a Guiné-Bissau durante um período turbulento, tem sido uma figura controversa na política guineense. Sua presidência foi marcada por tensões constantes com diversas instituições e organizações da sociedade civil, culminando agora nestas acusações diretas de responsabilidade por atos de violência.

Exigências de Transparência e Justiça

As organizações apresentaram um conjunto claro de exigências às autoridades competentes:

Investigação Independente do Assassinato

O documento exige categoricamente a abertura imediata de um inquérito independente, credível e imparcial sobre o assassinato de Mamadu Tano Bari. Esta exigência reflete a desconfiança generalizada nas instituições judiciárias do país e a necessidade de garantir que a investigação seja conduzida sem interferências políticas.



Divulgação dos Resultados Forenses

As organizações também exigem a divulgação urgente dos resultados da perícia forense por parte da Polícia Judiciária. Esta transparência é considerada fundamental para garantir à família da vítima o direito inalienável à verdade e à justiça, princípios básicos do Estado de Direito.

Responsabilização pelos Ataques à Imprensa

No que concerne à agressão ao jornalista Waldir Araújo, as entidades repudiam o ataque com "total indignação" e apelam à identificação e responsabilização penal dos agressores. Esta posição reforça a importância da liberdade de imprensa como pilar fundamental da democracia.

Alerta sobre Ameaças à Democracia

Num tom de forte alerta, o Espaço de Concertação e a Frente Popular chamaram a atenção do povo guineense para os "perigos reais e crescentes" que Umaro Sissoco Embaló representa para:

  • A integridade das instituições - A erosão das estruturas democráticas e do funcionamento normal do Estado
  • Os direitos dos cidadãos - A violação sistemática dos direitos humanos fundamentais
  • A estabilidade nacional - O risco de agravamento da crise política e social

O Papel das Organizações da Sociedade Civil

O Espaço de Concertação das Organizações da Sociedade Civil da Guiné-Bissau tem desempenhado um papel crucial no monitoramento da situação democrática do país. Esta plataforma agregadora de diversas organizações não-governamentais tem sido uma voz consistente na defesa dos direitos humanos e da transparência governamental.

A Frente Popular, por sua vez, representa um movimento político que tem se posicionado criticamente em relação às práticas autoritárias e à corrupção no país. A união destas duas forças numa condenação conjunta demonstra a amplitude do repúdio aos recentes eventos.

Contexto Histórico da Instabilidade Guineense

A Guiné-Bissau tem uma longa história de instabilidade política, com sucessivos golpes de Estado, assassinatos políticos e crises institucionais. O país, que conquistou a independência de Portugal em 1974, nunca conseguiu estabelecer um sistema democrático verdadeiramente estável.

Os problemas estruturais incluem:

  • Fragilidade institucional - Instituições democráticas frágeis e frequentemente instrumentalizadas
  • Corrupção endémica - Sistemas de corrupção que permeiam diversos níveis do Estado
  • Tráfico de drogas - A posição geográfica estratégica tornou o país uma rota importante para o tráfico internacional
  • Pobreza extrema - Condições socioeconómicas precárias que alimentam a instabilidade

Impacto na Liberdade de Imprensa

A agressão ao jornalista Waldir Araújo da RTP-África representa um ataque direto à liberdade de imprensa na região. A RTP-África, como órgão de comunicação social português com cobertura nos países africanos de língua portuguesa, desempenha um papel importante na divulgação de informação sobre a Guiné-Bissau para o mundo lusófono.

Este incidente insere-se num padrão mais amplo de ataques aos media na África Ocidental, onde jornalistas enfrentam crescentes ameaças no exercício da sua profissão. A comunidade internacional tem expressado preocupação com a deterioração das condições de trabalho para os profissionais dos media na região.

Reações Internacionais Esperadas

Embora o comunicado não mencione reações internacionais específicas, é expectável que organizações internacionais de defesa dos direitos humanos e da liberdade de imprensa se pronunciem sobre estes eventos. A Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), a União Africana e organizações como a Repórter Sem Fronteiras têm historicamente monitorizado a situação na Guiné-Bissau.

Implicações para a Estabilidade Regional

A instabilidade na Guiné-Bissau tem implicações que transcendem as fronteiras nacionais. O país situa-se numa região já marcada por diversos desafios de segurança, incluindo atividades terroristas no Sahel, tráfico de drogas e migração irregular.

A deterioração da situação interna pode contribuir para:

  • Fluxos migratórios - Aumento da emigração para países vizinhos e Europa
  • Atividades criminosas - Expansão de redes de tráfico de drogas e outros crimes transnacionais
  • Contágio político - Possível influência desestabilizadora em países vizinhos

O Papel da Comunidade Internacional

A comunidade internacional, particularmente os países da CPLP (Comunidade dos Países de Língua Portuguesa) e as organizações regionais africanas, têm uma responsabilidade crucial no apoio à estabilização da Guiné-Bissau.

As possíveis medidas incluem:

  • Mediação política - Facilitação do diálogo entre as diferentes forças políticas
  • Apoio técnico - Assistência no fortalecimento das instituições democráticas
  • Monitorização - Acompanhamento contínuo da situação dos direitos humanos
  • Pressão diplomática - Utilização de canais diplomáticos para promover a responsabilização

Perspetivas Futuras

O futuro da Guiné-Bissau depende largamente da capacidade das diferentes forças políticas e sociais encontrarem um caminho para o diálogo e a reconciliação. O papel das organizações da sociedade civil, como demonstrado neste comunicado conjunto, será crucial na pressão por transparência e justiça.

A mobilização da sociedade civil, conforme apelado pelas organizações, pode ser um fator determinante para:

  • Pressão por justiça - Manter a pressão pública para investigações credíveis
  • Proteção de direitos - Defender os direitos humanos fundamentais
  • Fortalecimento democrático - Promover o funcionamento das instituições democráticas

Compromisso com os Valores Democráticos

No final do seu comunicado, as organizações reafirmaram o seu compromisso inabalável com a justiça, a liberdade e a dignidade humana. Este compromisso traduz-se num apelo à mobilização de todas as forças democráticas em defesa de três pilares fundamentais:

  1. Legalidade - O respeito pelo Estado de Direito e pelas normas jurídicas
  2. Soberania popular - O reconhecimento da vontade do povo como fonte de legitimidade política
  3. Verdade - A transparência e a honestidade na vida pública

Desafios para as Investigações

As investigações dos dois casos enfrentarão diversos desafios:

Obstáculos Técnicos

  • Limitações na capacidade forense das autoridades locais
  • Possível contaminação ou perda de evidências
  • Recursos limitados para investigações complexas

Obstáculos Políticos

  • Possível interferência política nas investigações
  • Ameaças a testemunhas e investigadores
  • Pressões para arquivamento dos casos

Obstáculos Sociais

  • Clima de medo e intimidação
  • Desconfiança da população nas instituições
  • Polarização social e política

O Legado de Mamadu Tano Bari

Embora poucos detalhes tenham sido divulgados sobre a vida de Mamadu Tano Bari, a sua função como ex-agente da segurança presidencial coloca-o numa posição particular no aparelho de Estado. Os agentes de segurança presidencial têm acesso a informações sensíveis e desempenham funções críticas na proteção das mais altas figuras do Estado.

O seu assassinato levanta questões sobre:

  • Motivações - Se o crime teve motivações políticas, pessoais ou criminais
  • Informações - Se Bari possuía informações comprometedoras para figuras políticas
  • Segurança - As falhas no sistema de proteção de ex-funcionários estatais

Impacto na Opinião Pública

A conjugação dos dois eventos - o assassinato de um ex-agente de segurança e a agressão a um jornalista - tem um impacto significativo na opinião pública guineense. Esta situação pode contribuir para:

  • Desconfiança institucional - Erosão da confiança nas instituições do Estado
  • Autocensura - Medo entre jornalistas e ativistas de expressarem opiniões críticas
  • Polarização - Aprofundamento das divisões políticas e sociais

Papel dos Media Internacionais

A cobertura destes eventos pelos media internacionais será crucial para manter a pressão sobre as autoridades guineenses. A RTP-África, enquanto vítima direta dos ataques, tem uma responsabilidade particular na divulgação da situação.

Os media internacionais podem contribuir através de:

  • Visibilidade - Manter os casos na agenda pública internacional
  • Pressão - Criar pressão diplomática através da opinião pública internacional
  • Solidariedade - Demonstrar solidariedade com os colegas jornalistas locais

Conclusão: Um Momento Decisivo

Os eventos de julho de 2025 na Guiné-Bissau representam um momento decisivo para o futuro democrático do país. A resposta da sociedade civil, das autoridades nacionais e da comunidade internacional determinará se estes crimes permanecerão impunes ou se marcarão o início de uma nova era de responsabilização e transparência.

O apelo das organizações da sociedade civil para a mobilização de todas as forças democráticas reflete a gravidade do momento e a necessidade urgente de ação coordenada para defender os valores fundamentais da democracia, dos direitos humanos e do Estado de Direito.

A Guiné-Bissau encontra-se numa encruzilhada: pode escolher o caminho da justiça, da transparência e da reconciliação, ou pode continuar na espiral de violência e impunidade que tem caracterizado a sua história recente. A escolha que for feita nas próximas semanas e meses terá implicações duradouras para o futuro do país e da região.

O eco das palavras do Espaço de Concertação das Organizações da Sociedade Civil e da Frente Popular ressoa como um apelo urgente à consciência nacional e internacional: a democracia na Guiné-Bissau está em perigo, e apenas uma resposta firme e coordenada pode salvaguardar os direitos e a dignidade do povo guineense.

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